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CARTA ABERTA À COMUNIDADE, ÓRGÃOS PÚBLICOS E IMPRENSA

Acerca do desenvolvimento sustentável do Vale dos Vinhedos e pareceres desta entidade em relação a projetos de incorporação imobiliária apreciados no Conselho Distrital do Vale dos Vinhedos em março do presente ano

A APROVALE – Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos – vem a público manifestar a posição da entidade em prol do desenvolvimento sunstentável do Vale dos Vinhedos. Esta posição está embasada em análises técnicas e estudos realizados por consultores, mestres acadêmicos e diversos profissionais credenciados de Arquitetura, Engenharia Civil e Incorporação Imobiliária que apoiam esta entidade, igualmente consensada pela totalidade dos membros de sua Diretoria Executiva e Conselho Superior.

No primeiro semestre de 2021, meio milhão de pessoas buscaram a paz rural do Vale dos Vinhedos. Em 2022, a expectativa é que que este número dobre. Ainda assim, o Vale dos Vinhedos, que hoje possui 336 unidades habitacionais (com 581 leitos) não apresenta ocupação média mensal em seus hotéis e pousadas superior a 50%, dado que existe uma grande diferença de procura entre os dias da semana e os finais de semana. Este quadro é típico do turismo rural, no qual se enquadra o enoturismo. Portanto, é falsa a premissa de que há “déficit de hospedagem” em nosso destino. Por este motivo, a Aprovale defende que o crescimento da oferta de hospedagem no Vale dos Vinhedos acompanhe a real demanda desta área rural.
 
Atualmente a paisagem dos vinhedos, as visitas a cantinas e vinícolas, as belezas naturais, a tranquilidade e o isolamento se unem a uma oferta de entretenimento e gastronomia que valorizam a cultura do vinho. Estes são os principais atrativos em um destino enoturístico de sucesso. A atividade vitivinícola é o principal fator de atração de turistas, e nosso Plano Diretor deve continuar a preservá-la. É imperioso respeitar a vocação rural do Vale dos Vinhedos e refrear o adensamento dos aglomerados, que rapidamente podem se transformar em urbanização desordenada. Cada vez que um aglomerado se adensa, diminui a área que está (ou poderá ser) dedicada à atividade fim do Vale dos Vinhedos – o cultivo dos vinhedos e a produção de vinho de excelente qualidade, que projeta nossa região no Brasil e no exterior.
 
No Mapa de Ocupação do Solo do Vale dos Vinhedos do ano de 2020 (abaixo), está claro o caráter atípico e danoso do adensamento em nossa região, pois este não ocorre do centro para a periferia e sim em múltiplas áreas (em vermelho). O Professor e Doutor. Vander Valduga, da Universidade Federal de Curitiba alerta para os riscos iminentes à atividade e a paisagem vitivinícola que esta ocupação representa. 

 
Este mesmo alerta nos traz o Doutor Roner Fabris, advogado especializado em propriedade intelectual e estudioso de cases de Denominação de Origem, salientando que a preservação da área rural e da paisagem vinícola local estão protegidas pelo artigo 216 inciso V de Constituição Federal. Dr. Roner relembra que “as indicações geográficas são reconhecidas pelo Estado brasileiro na medida em que seus vinhos carreguem qualidades ou características que se devam exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluídos fatores naturais e humanos. (art 178 da L9279/96). Assim, os fatores humanos e naturais são essenciais na Denominação de Origem. Estes fatores são harmônicos e cumulativos. Uma Denominação de origem não sobrevive na ausência de um deles”. Ou seja, sem território preservado e com vinhedos produtivos, destruiremos a nossa Denominação de Orrigem. “Quando se contrapõem as imagens da região da denominação de origem do VALE DOS VINHEDOS, nota-se claramente, que áreas que “deveriam” ser áreas de vinhedos, já apresentam construções comerciais ou residências que seguem ao longo das vias públicas. Nota-se um relaxamento das municipalidades, que permitem empreendimentos imobiliários locais. Qual será o limite?” questiona o advogado consultor e membro da APROVALE.
 
Cabe a nós, empreendedores, produtores, gestores públicos e principalmente, cidadãos, manter nossos pés e nossas vinhas bem plantados no chão. Chegou o momento de reavaliar e planejar como nosso precioso território vitivinícola continuará conciliando boas safras e benvindas temporadas enoturísticas sem os prejuízos do desenvovimento desordenado. A seguir, elencamos alguns dos muitos fatores que impactam negativamente no desenvolvimento sustentável do Vale dos Vinhedos e na preservação da sua vocação para o enoturismo.
 
 
1. PERFIL DOS EMPREENDIMENTOS ANALISADOS
 
Os empreendimentos avaliados são INCORPORAÇÕES IMOBILIÁRIAS que compreendem diversas atividades em seu projeto (restaurantes, comércio, estacionamentos, parques de entretenimento, imóveis e unidades habitacionais). A hotelaria é apenas uma das atividades possíveis nestes projetos, não seu escopo total ou prioritário. Portanto, os estudos de impacto e viabilidade deste projetos devem ser sob o título de INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA com venda imóveis escriturados e não simplesmente hotelaria.
Em entrevista recente a um veículo local, o próprio responsável comercial de um dos resorts explica porque seu empreendimento não é apenas um hotel:
“A diferença para um hotel se dá justamente no propósito de transformar o valor gasto em férias, em patrimônio, uma vez que concluído o pagamento da fração o benefício permanece como patrimônio através de sua escritura individualizada”, detalha Maxuel Sales, diretor Regional de Vendas do empreendimento em questão.
 
2. MODALIDADE DE VENDA DOS IMÓVEIS E UNIDADES HABITACIONAIS e IMPACTO SOBRE O USO DO TERRITÓRIO
 
A  comercialização destes imóveis se dará pela modalidade “multipropriedade”. Segundo a lei Lei nº 13.777, a multipropriedade de imóveis é um modelo de aquisição de bens imobiliários. Trata-se de uma compra coletiva, em que cada comprador adquire uma escritura de parte da propriedade. Não existe limite de compra, é possível adquirir mais cotas (semanas) e, desse modo, conquistar o direito de passar um tempo maior (residir) no imóvel. Quem comprar a totalidade das cotas terá direito à escritura de propriedade integral do imóvel. Terá inclusive, o direito de nele residir, alugá-lo ou vendê-lo para outro morador. Portanto , na prática, trata-se de uma forma de facilitar a venda de imóveis. Mesmo que o empreendimento vista-se sob a roupagem de “hotelaria”, quem decide como cada unidade habitacional será usada é o proprietário da escritura do imóvel, de acordo com a quantidade de cotas que comprar e seu proveito pessoal.
 
3. ESCALA DOS PROJETOS E IMPACTO SOBRE RESIDENTES E MOBILIDADE 
 
A modalidade de venda imóveis e unidades habitacionais por “multipropriedade” não constitui, em si, necessariamente fator de impacto negativo em empreendimentos de pequeno e médio porte, cujas propriedades sejam de tamanho incompatível com o uso como residência. Portanto, projetos que se atenham à venda de unidades habitacionais no formato de quartos destinados exclusivamente à hotelaria (com regimento que impeça o uso como residência provisória ou permanente) e que restrinjam o número de ocupantes de acordo com um número fixo de leitos, são passíveis de aprovação e já se verifica o apoio da entidade a projetos dentro deste escopo e escala.
 
Resorts, porém, são projetados em escala grandiosa para que sua equação financeira seja lucrativa. Os dois empreendimentos em aprovação somam 1021 unidades de multi-propriedades a serem comercializadas em 53.092 escrituras. Se cada cota for utilizada minimamente por um casal, aportarão um público superior a dois mil proprietários residindo por no mínimo uma semana no Vale dos Vinhedos ao longo do ano. Este número dobra a população residente no Vale, dobra o número de veículos de moradores circulando diariamente no destino e se soma ao um milhão de visitantes que já trafegam na estreita e despreparada RS 444. E neste parágrafo não está considerado o fluxo extra gerado pela mão de obra necessária à construção e a operação destes mega empreendimentos.
 
Todos sabemos que a infraestrutura de acesso rodoviário ao Vale dos Vinhedos não comportará este fluxo, mesmo que fosse viável a sua completa duplicação, construção de acostamentos, passeios e áreas de escape.  Salientamos que não existe sequer um projeto rodoviário complementar por parte dos proponentes ou do município que ampare um incremento de fluxo deste porte.
 
4. MÃO DE OBRA PARA CONSTRUÇÃO, OPERAÇÃO E IMPACTOS SOCIAL E DE MODALIDADE
 
Os dois empreendimentos em aprovação anunciam a demanda de mão de obra em ordem superior a  3.000 vagas durante a fase de construção e 2.300 vagas para a operação. O Vale dos Vinhedos não possui a infraestrutura básica necessária (energia, água, saneamento, saúde, transporte e ensino) para abrigar esta população, seja durante as obras ou depois na operação. Esta imensa população de trabalhadores não está disponível em nossa cidade  e ou municípios circundantes, portanto terá que ser “importada”. Onde residirão estes três mil novos trabalhadores? Como se deslocarão para o trabalho diariamente, em uma rodovia que, conforme vimos acima, já mal comportará os próprios novos residentes semanais? Três  mil trabalhadores equivalem a 75 ônibus lotados entrando e saindo do Vale pelo menos duas vezes por dia. O aumento abrupto do fluxo migratório para o Vale dos Vinhedos e arredores causará IRREVERSÍVEL impacto social, ambiental e de segurança na região.  Não foi apresentado à APROVALE qualquer projeto que ampare e ordene esta ocupação por parte dos proponentes ou do município. Dada a restrita capacidade de fiscalização municipal, será impossível coibir a ocupação irregular e desordenada dentro do território vitivinícola e nas periferias do Vale.
 
5. USO DO TERRITÓRIO VITIVINÍCOLA EM DESACORDO COM SUA VOCAÇÃO RURAL E PLANO DIRETOR
 
Um dos projetos analisado prevê a instalação de 120 lojas e 1.112 vagas de estacionamento em piso concretado. Estes números são superiores aos dos shopping centers urbanos de todas as cidades ao redor do Vale dos Vinhedos. Outro projeto sequer quantifica quantas vagas de estacionamento serão necessárias para atender à demanda e apenas declara que  “fará parceria com os vizinhos para acomodar o restante”. Mencionam a impermeabilização de área superior a  30.000m2 para estacionamentos, em terreno que deveria contemplar vinhedos e não há comparativo das áreas atuais de vinhedos e das áreas que efetivamente se destinariam à vitivinicultura produtiva.
 
Salientamos que qualquer projeto dentro do Vale deve levar em conta o disposto na Seção II do PLANO DIRETOR DO DISTRITO DO VALE DOS VINHEDOS, ARTIGOS 36, 37, 39, 78 E 79. Embora não se especifique a área mínima de vinhedos a ser preservada e/ou implantada por novos empreendimentos, o Art. 78, que trata de condomínios vitivinícolas, exige um mínimo de 60% de vinhedos. Por extensão, a mesma exigência mínima deveria ser aplicada nos presentes caso de incorporação imobiliária.
 
Já o Anexo 3.2 – OCUPAÇAO DO SOLO da página 4: Vias Categoria 2 – ERS 444 e ERS 431 determina os parâmetros a serem obedecidos quanto a bandas, envelope, distribuição e recuos viários. Verificamos que para atender a banda 1 (a menos restritiva) o empreendimento poderia ter uma área de, no máximo, 27.210,00m2. A área mencionada no ofício do IPURB ao Conselho distrital para um dos projetos é de 56.952,28m2, portanto está absolutamente IRREGULAR.
 
O Art. 59. A Área Rural determina que o uso do território do Vale dos Vinhedos deva ser predominantemente vitivinícola. Outras atividades, tais como residenciais, comerciais e de serviços, desde que associadas às atividades vitivinícolas ou necessárias à população residente, devem estar em localizações e escalas compatíveis com a manutenção do caráter da região e do padrão básico da atividade produtiva. Os megaprojetos de resorts estão fora desta escala em todos os seus aspectos construtivos e de operação.
 
6. PARECER TÉCNICO E COMPETÊNCIAS
 
Além de seus próprios parâmetros e análises, sempre apresentados em reunião do Conselho Distrital, onde a Aprovale é representada por dois associados eleitos para sua Diretoria Executiva (titular e suplente), nossa entidade também toma por base para seu posicionamento nas questões de aprovação de projetos o voto técnico do próprio Conselho Distrital. A responsável técnica analisa 35 parâmetros, separados em 4 grandes grupos: impactos na paisagem, no meio ambiente; no sistema de atividades e na promoção econômica. O voto contrário aos projetos de megaresorts manifesto pela técnica do Conselho Distrital, a arquiteta e urbanista Sra. Vanja Hertcert, tem o apoio da APROVALE.
Qualquer membro do Conselho pode, e deve, rejeitar todo empreendimento que seja potencialmente danoso para o território. 
 
A Aprovale compreende que cabe ao IPURB a análise técnica de projetos de imobiliários  quanto aos seus aspectos construtivos, estudos de impacto e atendimento à legislação em vigor e viabilidade. E cabe ao Conselho Distrital analisar o contexto dos impactos socio-econômicos à comunidade, à preservação ambiental e cultural e às questões intangíveis como patrimônio histórico, vocação territorial e sustentablidade do destino. As duas entidades – IPURB e Conselho Distrital – atuam de forma complementar, o que justifica o voto do Conselho ser deliberativo, uma vez que o Ipurb analisa a parte e não o todo. 
 
Por parte da APROVALE, é também nossa obrigação primordial proteger a área de marcada da Denominação de Origem Vale dos Vinhedos de ver-se reduzida em prol de shopping centers, estacionamentos, parques temáticos e especulação imobliária sob qualquer modalidade de venda. É nosso dever e obrigação apoiar a preservação e a expansão das áreas vitivinícolas, a continuidade dos nossos produtores em suas propriedades, o enoturismo inteligente e sustentável dentro da escala que nosso destino é capaz de sustentar. Como bem aconselha o mundialmente reconhecido Mestre em Enoturismo Luis Vicente Elias Pastor (responsável pelo Museu Vivanco, Espanha), “os projetos que se propõem, apesar de produzirem um benefício laboral e comercial para a cidade de Bento Gonçalves, acabarão por destruir o verdadeiro sentido do Enoturismo, que é a visita a adegas e vinhas. A sua implantação noutra zona seria desejável e preservaria o principal motor do enoturismo, que é a vinha.”
 
Convictos de haver sensibilizado nossos governantes, órgãos públicos e comunidade quanto à premência e necessidade de reavaliação e adequação destes projetos face à vocação primordial do Vale dos Vinhedos, reiteramos nosso voto negativo à aprovação dos referidos  projetos de megaresorts tais como se apresentam. Dadas suas características e escala, não se adequam à região demarcada da D.O. Vale dos Vinhedos, ou mesmo aglomerados. Rogamos aos empreendedores e poder público considerar uma nova localização para estes projetos – e quaisquer outros de mesmo porte e perfil imobiliário – em áreas fora do Vale dos Vinhedos e que possam se beneficiar do desenvolvimento que se propõem a trazer para nossa cidade, gerando empregos, incremento turístico e de infraestrura onde haja verdadeiramente estas demandas. A vocação do Vale dos Vinhedos é essencialmente vitivinícola e assim deve permanecer para que este destino se perpetue e se desenvolva de forma sustentável para seus moradores, empreendedores e visitantes.
 

Assinam esta carta aberta todos os membros da Diretoria Executiva e do Conselho Superior da APROVALE

APROVALE - NOMINATA
___________________________________________________________________
Sandro Valduga – Presidente APROVALE

Diretoria Executiva:
Ronaldo Zorzi - Vice-presidente categoria de Associado Produtor
Jacinta Burille Valente – Vice-presidente categoria de Associado Setorial
Douglas Chamon – Diretor Administrativo-Financeiro
Moisés Brandelli – Diretor Técnico
Deborah Villas-Bôas Dadalt – Diretora de Enoturismo e Infraestrutura
Marcos Giordani – Diretor de Relações Comunitárias
Jaqueline Schutkoski - Diretora de Associados
Tiago Crestani – Diretor de Marketing e Comunicação

Conselho Superior: 
Jones F. Valduga 
Ademir Brandelli
Adriano Miolo 
Denise Brandelli
Aldemir S. Dadalt
Juarez Valduga
Marcos A. Valduga
Rogério C. Valduga

 

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